Por DANIELA MARX
O Première Vision destacou uma Indústria Têxtil em transformação, onde inovação, sustentabilidade e tradição se entrelaçam para moldar o futuro da moda.
A edição Primavera-Verão 2026 do Première Vision, realizada de 11 a 13 de fevereiro de 2025 no Paris Nord Villepinte Exhibition Center, reuniu mais de 1.060 expositores de aproximadamente 40 países, consolidando-se como um evento central para profissionais da moda interessados nas últimas inovações em têxteis, couro, acessórios e design.
Temas Centrais da Temporada
Esta temporada foi estruturada em torno de três temas principais: RE-FRESH, RE-SET e RE-STORE (em português, Renovar, Redefinir e Restabelecer), cada um refletindo uma análise profunda sobre os estilos de vida contemporâneos e sobre o impacto da indústria da moda – que está reavaliando suas práticas, mudando sua perspectiva e recuperando o ímpeto com soluções adaptadas às mudanças no consumo, usos, clima e recursos.
RE-FRESH
Inovação que revigora
Representa uma resposta clara aos desafios de um planeta em aquecimento. Mais do que uma tendência estética, trata-se de uma postura frente à urgência climática, propondo soluções que combinam biotecnologia, inteligência artificial e inovação industrial para transformar o desconforto térmico em bem-estar sensorial. A estação propõe materiais com propriedades técnicas capazes de refrescar, proteger e regular a temperatura corporal, priorizando o conforto inteligente.


Esteticamente, esse movimento busca inspiração em paisagens nórdicas e atmosferas geladas — geleiras, brumas, lagos, névoas. A cartela de cores transita por tons aquáticos, entre o azul do gelo e o brilho translúcido da água em movimento, evocando sensações de pureza, serenidade e leveza.
Mais do que refrescar fisicamente, o RE-FRESH também propõe um respiro mental e emocional. A calma passa a ser um luxo. A pausa, uma tecnologia emocional. Nesse contexto, a inteligência artificial não entra como ameaça criativa, mas como ferramenta de libertação de tempo, permitindo que o fator humano, cada vez mais valorizado, dedique-se ao que há de mais nobre: a imaginação, a criação e a inovação com propósito.



RE-SET
Redefinindo nossa maneira de pensar para revitalizar
Propõe uma redefinição da maneira como pensamos, criamos e interagimos com o mundo. Em um tempo marcado pela dureza das crises, pelas ansiedades do futuro e pela aceleração da vida cotidiana, o tema resgata o hedonismo e a ludicidade como antídotos criativos — estratégias emocionais e sensoriais para viver o agora com mais intensidade e imaginação. A brincadeira e o hedonismo oferecem leveza para a dureza do presente, e nos ajudam a enfrentar um futuro incerto com abordagens inventivas, livres e totalmente disruptivas.


A temporada valoriza o prazer como experiência vital, é tudo sobre a experiência e nutrir os instintos naturais, incentivando a liberdade inventiva, a conexão com os outros e a alegria que experimentamos em viver juntos.
Esteticamente, RE-SET se traduz em uma paleta solar e sensorial, com tons que evocam sensualidade, que remetem a cascas de frutas caramelizadas e nuances de pele beijada pelo sol, sugerindo suavidade e deleite sensorial. As formas são suaves, abertas ao movimento e ao conforto. O vestir se transforma em experiência, em celebração do corpo e da convivência — longe da rigidez, próximo da vida.



RE-STORE
Nos lembra que inovar não é apagar o que veio antes, mas sim costurar passado e futuro com intenção
Em uma indústria marcada pelo desperdício e pela obsolescência, essa mudança de mentalidade não é apenas necessária, é urgente. Restaurar é uma forma de resistência e também de liderança. E quem souber traduzir essa consciência em produto, narrativa e posicionamento, estará moldando o presente com o peso de quem já entendeu que o futuro será mais sustentável.
É um convite à reparação. Não apenas de produtos ou processos, mas das conexões humanas, da relação com o planeta e da própria lógica industrial que rege o sistema da moda. A proposta é restaurar tudo, desde conexões a produtos, respeitando a forma original, sem apagar a história, adaptando produtos às necessidades e readaptando processos aos recursos.
Circularidade, sustentabilidade e transparência são pré-requisitos para viver em nosso mundo com cuidado e deixar uma pegada positiva. Para inovar, para ajudar a moldar um futuro que seja firmemente enraizado sustentável, os desenvolvimentos se baseiam em um profundo conhecimento das origens e se reconectam com conhecimentos do passado, não como nostalgia, mas como potência de futuro.
Na temporada Primavera-Verão 2026, o design passa a atuar como ferramenta de cura. Reutilizar, adaptar, renovar – tudo com base em critérios claros de circularidade, sustentabilidade e transparência. Os materiais são pensados com profundidade e ética, levando em conta suas origens, impactos e ciclos. Há uma revalorização dos saberes ancestrais e dos processos artesanais, vistos agora como pilares de inovação regenerativa.
As cores acompanham esse movimento com paletas que equilibram profundidade e luminosidade, sugerindo uma fusão entre memória e renovação. Tons terrosos, minerais, pigmentos vegetais e contrastes orgânicos contam histórias de lugares, pessoas e técnicas. O visual não é só bonito, é enraizado, simbólico e responsável.






Inovações Sustentáveis e Tecnológicas
Das origens das matérias-primas e dos recursos que elas exigem até o gerenciamento do fim da vida útil de um produto, adotar uma abordagem sustentável para materiais durante todo o ciclo de vida – da origem ao descarte – é um grande desafio para a indústria da moda.

A sustentabilidade foi um foco central, com destaque para a utilização de resíduos da indústria agroalimentar na produção têxtil. Materiais alternativos ao couro e sintéticos foram desenvolvidos a partir de resíduos de frutas, utilizando engenharia avançada de materiais. Além disso, pigmentos derivados de resíduos de madeira certificada pelo FSC foram apresentados, garantindo total rastreabilidade na produção e distribuição.
A reciclagem têxtil também foi abordada, com novas fibras artificiais celulósicas produzidas através da reciclagem química de resíduos de algodão, como Circulose® e NuCycl®, inteiramente derivadas de algodão pré ou pós-consumo, sem adição de polpa de madeira. Enquanto isso, a fibra Relino é obtida pela reciclagem de fios de linho ou resíduos de produção para criar viscose por meio de um processo químico semelhante.

Impacto no Mercado
Essas tendências e inovações refletem uma transformação significativa na indústria têxtil, impulsionada pela necessidade de enfrentar desafios climáticos e atender às demandas de consumidores cada vez mais conscientes. A integração de biotecnologia e inteligência artificial na produção têxtil não apenas melhora a funcionalidade e o conforto dos produtos, mas também promove práticas mais sustentáveis. A ênfase na reutilização de resíduos e na reciclagem têxtil indica uma mudança em direção a uma economia circular, onde os recursos são utilizados de forma mais eficiente e responsável. Essa abordagem não só reduz o impacto ambiental da indústria, mas também abre novas oportunidades de mercado para produtos inovadores e sustentáveis. Além disso, a valorização de técnicas artesanais e saberes tradicionais, combinada com inovações tecnológicas, sugere uma tendência para produtos que equilibram tradição e modernidade, atendendo a consumidores que buscam autenticidade e qualidade. Em suma, o Première Vision Primavera-Verão 2026 destacou uma indústria têxtil em transformação, onde inovação, sustentabilidade e tradição se entrelaçam para moldar o futuro da moda.

Referências: Première Vision, The Interline, Fashion United.
DANIELA MARX
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